Eis um texto redigido por Emílio, do 1º ano de avançado. Ele fez de conta que este homem do laço era um seu amigo de longa data...
Aquele era o homem do laço, sempre bom amigo, que perguntava pelos meus problemas, pela minha família. Ele fazia perguntas pequeninas, bocadinho a bocadinho, mas às vezes semelhava não perceber, não ouvir, as minhas palavras. Ele falava e perguntava.
No meio da conversa, quando era no passeio da Baixa, ficava quieto, arrumava o seu laço, olhando para aima da minha cabeça, e, se calhar, com um adeus, ou não, fazia o trilho de volta para a sua morada, sozinho.
Porém, era o meu melhor amigo, que se voltava para a minha solidão, com grande esforço, desde o seu mundo preto, e voltava para a solidão de que vivia quase sempre, depois de partilhar o seu tempo, a pedaços, comigo.
O meu amigo, sempre de fato, laço preto e camisola branca, visitava três vezes por ano a loja de roupa da Senhora Amaral, e três vezes por dia a adega do Freitas, mas eu não conhecia o restaurante onde ele podia fazer o almoço ou o jantar.
Na loja da Senhora Amaral só demorava um bocadinho. Apanhava o pacote com as camisolas brancas três vezes por ano, e o pacote do fato e os laços pretos uma vez. Sempre as mesmas cores, o mesmo tamanho. Onde é que faz o jantar o meu amigo?
Na adega do Freitas demorava uma hora por jornada. O Freitas conhecia o seu comportamento, que não mudara nenhum centímetro ou nenhum minuto desde havia quinze anos. O Freitas conhecia o meu amigo muito bem; e ainda mais esperto era no tipo de vinho do qual ele gostava tanto, quase tanto como o amor intenso que sentia pelo silêncio. Compridos silêncios e quietudes de uma hora de duração.
Eu, na adega do Freitas, ficava perto, no balcão, mas o meu amigo, depois de pousar o copo junto à garrafinha, já vazia, vidro perto do vidro, pagava a sua dose de vinho e saia para a rua, desaparecido e obscuro. Eu demorava meia hora, e como já tínhamos combinado, sem palavras, deslocavam-me para o passeio da Baixa, onde ele e as suas perguntas aguardavam pela minha existência e pela parte proporcional da sua. Ele, às vezes, ficava quieto, arrumava o seu laço, olhando para cima da minha cabeça...
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